top of page
Foto do escritorProf. João Victor Laureano

Pneumonia por Aspiração: Quando Ampliar a Terapia Antibiótica é Realmente Necessário?

Pneumonia por aspiração

A pneumonia adquirida na comunidade (PAC) é uma condição comum e desafiadora que frequentemente leva a debates sobre o manejo adequado. Entre esses debates, destaca-se a abordagem à pneumonia por aspiração, especialmente no que diz respeito ao uso de antibioticoterapia ampliada para cobrir potenciais patógenos anaeróbicos. Apesar da prática comum de prescrever clindamicina ou piperacilina-tazobactam para esses casos, evidências recentes sugerem que essa abordagem pode não ser necessária na maioria das situações.


O Que é Pneumonia por Aspiração?


O termo "pneumonia por aspiração" não possui uma definição específica amplamente aceita, o que contribui para a confusão na prática clínica. A aspiração de conteúdo gastrointestinal (GI) para os pulmões é um evento comum, ocorrendo em até 50% da população. Contudo, nem toda aspiração resulta em pneumonia bacteriana. Em muitos casos, o ácido gástrico provoca uma pneumonite química autolimitada, com sintomas que desaparecem em um ou dois dias sem necessidade de antibióticos.


No entanto, como é difícil distinguir entre pneumonite e pneumonia, é prática comum usar antibióticos com o potencial para pneumonia por aspiração em mente.


Em uma pesquisa de 2001, a maioria dos intensivistas prescreveu antibióticos para pacientes com suspeita de aspiração, e 72,4% escolheram um regime de antibióticos empíricos em vez de um regime específico para patógenos.


A escolha de antibióticos pode variar com base na ecologia local da UTI. No entanto, é considerado adequado começar com antibióticos precoces, empíricos e de amplo espectro.


Posteriormente, durante as próximas 72 horas, o uso de antibióticos é descalonado com base na cultura definitiva e quantitativa. Caso nenhum crescimento bacteriano significativo seja observado na cultura, os antibióticos são então descontinuados.


Diretrizes Recentes e a Evidência Científica


As diretrizes de 2019 da Infectious Diseases Society of America (IDSA) sobre pneumonia adquirida na comunidade incluíram uma nova recomendação sobre a abordagem à pneumonia por aspiração. A questão levantada foi: deve-se adicionar cobertura anaeróbica ao tratamento empírico padrão para pacientes com suspeita de pneumonia por aspiração em ambiente hospitalar?


A recomendação, baseada em evidências de baixa qualidade, sugere que a cobertura anaeróbica adicional não deve ser incluída rotineiramente, a menos que haja sinais claros de abscesso pulmonar ou empiema.


Essa orientação reflete dados mais recentes que questionam o papel de bactérias anaeróbicas na etiologia da pneumonia por aspiração. Estudos antigos, como o de 1975 que isolou anaeróbios em todos os pacientes "propensos à aspiração", apresentavam falhas metodológicas, incluindo o uso de amostragem transtraqueal e a avaliação de pacientes em estágios avançados da doença.


Estudos mais modernos reforçam essa perspectiva:

  • Um estudo de 1999, com 143 pacientes submetidos à lavagem broncoalveolar, identificou apenas um organismo anaeróbico (não patogênico).

  • Outro estudo, em 2003, analisou 95 pacientes idosos institucionalizados com pneumonia aspirativa grave. Apenas 16% dos patógenos isolados eram anaeróbicos, levando os autores a questionar a necessidade de cobertura rotineira para esses microrganismos.


Quer saber como funciona na prática? Conheça nossa Pós-graduação👇 



O Papel do Farmacêutico


A crença de que pacientes com fatores de risco para aspiração exigem cobertura antibiótica ampliada está profundamente enraizada na prática médica. Isso pode levar ao uso desnecessário de antibióticos, contribuindo para a resistência antimicrobiana e aumentando os custos e efeitos adversos associados ao tratamento.


Os farmacêuticos desempenham um papel crucial na mudança dessa mentalidade. Ao fornecer educação baseada em evidências e influenciar as decisões das equipes de saúde, podem ajudar a restringir o uso de antibióticos desnecessários. Para pacientes com PAC e suspeita de aspiração, a escolha de uma terapia empírica mais direcionada é muitas vezes suficiente, com a ampliação da cobertura reservada para casos específicos, como abscessos pulmonares ou empiema.


Reflexões Finais


O manejo da pneumonia por aspiração exige um equilíbrio entre a prática clínica tradicional e as evidências mais recentes. Embora seja tentador ampliar a terapia para cobrir todos os possíveis patógenos, as diretrizes atuais destacam que essa abordagem deve ser usada com cautela e em situações específicas.


A adesão a essas diretrizes não apenas melhora os desfechos clínicos, mas também desempenha um papel significativo na preservação da eficácia dos antibióticos, um recurso cada vez mais escasso. Essa é uma mudança que, embora desafiadora, é essencial para uma prática clínica mais segura e eficaz.



Gostou do conteúdo? Compartilhe com colegas e promova práticas baseadas em evidências na sua instituição!




REFERÊNCIAS 


Cesar, L., Gonzalez, C., & Calia, F. M. (1975). Bacteriologic flora of aspiration-induced pulmonary infections. Archives of internal medicine, 135(5), 711–714. https://doi.org/10.1001/archinte.135.5.711 El-Solh, A. A., Pietrantoni, C., Bhat, A., Aquilina, A. T., Okada, M., Grover, V., & Gifford, N. (2003). Microbiology of severe aspiration pneumonia in institutionalized elderly. American journal of respiratory and critical care medicine, 167(12), 1650–1654. https://doi.org/10.1164/rccm.200212-1543OC

Marik, P. E., & Careau, P. (1999). The role of anaerobes in patients with ventilator-associated pneumonia and aspiration pneumonia: a prospective study. Chest, 115(1), 178–183. https://doi.org/10.1378/chest.115.1.178


Metlay, J. P., Waterer, G. W., Long, A. C., Anzueto, A., Brozek, J., Crothers, K., Cooley, L. A., Dean, N. C., Fine, M. J., Flanders, S. A., Griffin, M. R., Metersky, M. L., Musher, D. M., Restrepo, M. I., & Whitney, C. G. (2019). Diagnosis and Treatment of Adults with Community-acquired Pneumonia. An Official Clinical Practice Guideline of the American Thoracic Society and Infectious Diseases Society of America. American journal of respiratory and critical care medicine, 200(7), e45–e67. https://doi.org/10.1164/rccm.201908-1581ST


Kollef MH, Bock KR, Richards RD, Hearns ML. The safety and diagnostic accuracy of minibronchoalveolar lavage in patients with suspected ventilator-associated pneumonia. Ann Intern Med. 1995;122:743–748

Rebuck JA, Rasmussen JR, Olsen KM. Clinical aspiration-related practice patterns in the intensive care unit: A physician survey. Crit Care Med. 2001;29:2239–2244.


American Thoracic Society; Infectious Diseases Society of America. Guidelines for the management of adults with hospital-acquired, ventilator-associated, and healthcare-associated pneumonia. Am J Respir Crit Care Med. 2005;171:388–416


Gostou deste conteúdo? Compartilhe com seus colegas farmacêuticos e siga-nos para mais informações detalhadas sobre medicamentos e práticas farmacêuticas!

 

Siga-nos no Instagram @propositocursos




21 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page